De Zé Pituca a Daniel

          “Como você se chama?” Eu não me chamo, os outros é que me chamam.  Muitos dos meus queridos amigos e familiares tem apelidos. Nenão, Teko, Nó, Onça, Pantera, Quibe, Goofy, Matiomein (macho man), Grinch, Mentirinha (tem a perna curta), Zaka, Yogy, Fumaça, Mãozinha, Pezão, Gaúcho, Chininha, Japa, Índio, Gerúndio (Armando), Jedái, Leco, Coquinho, Laranja (não é ocê não, Bagaço), Chewbacca, Bobby Esponja, Lampião, Corpinho, Chico Bento, Pédipano, Cebolinha, Cebola, Torrado, Homem Aranha, Xerife, BimLadi, Catatau, Jornal (em Mogi das Cruzes um dos jornais não é publicado na segunda feira, o Jonas também não aparece no trabalho às segundas).  Tem apelido que é fruto da aparência física. Uns são rótulos que vem de um momento caricato. Outros são composições de dois ou mais nomes ou iniciais, e ainda outros, abreviações do próprio nome, como no caso do Jovalso, e do Cop, Caco, Lú, Rê, Pá, Tonho, Lau (meu pai), Má, Chico, etc. 
          No seminário onde estudei tinha o Cara-de-lixa, o Capilé, o Capacete, Capivara, Cotia, Chacal, Virgulino, Camaleão, Peruca-de-padre, Jeremias (Chorão), Capitão Caverna, Papa-Léguas, Papai Smurf, Vovô Smurf, Penguim (inimigo do Batman), Nhonho, e muitos outros. Era comum, no seminário, os alunos receberem diversos apelidos, talvez para facilitar a comunicação entre os colegas. Lá no Seminário Presbiteriano do Sul em Campinas era assim. No início do ano os calouros eram "batizados" debaixo de uma torneira quando recebiam os "nomes" pelos quais seriam conhecidos no seminário e alguns até hoje. Cada um era identificado mais pelo apelido do que pelo nome. Nem todos gostam do seu apelido, e quando o alcunhado se irrita, aí é que pega mesmo. Uma noite no inicio do curso, vestido de quimono, recebi o nome de Tartaruga Ninja.  Este apelido tem algumas variações: Turtle, Tarta, Torto, Totinho.  Os apelidos não me incomodam tanto, eu sei o meu nome e sei o significado do meu nome. O meu nome significa Deus é meu juiz. Minha identidade em Cristo fala mais sobre quem eu sou do que qualquer apelido. Mas não foi sempre assim.
          Na vida real, todo mundo busca uma maneira mais fácil de identificar a si mesmo e aos outros também. Somos identificados na maioria das vezes por aquilo que fazemos. Mas no interior do coração, a sátira e a diversão parecem diminuir, e a percepção de quem somos é muitas vezes sombria e dolorida. Sofremos por uma identidade quebrada proveniente do pecado de cada um. Publicamente também, é comum sermos identificados por nossos fracassos.  Todos nós falhamos e falharemos muito. Ainda mais do que isso, todos nós pecamos e continuamos a pecar.

Portanto, assim como por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado, a morte, assim também a morte passou a todos os homens, porque todos pecaram. (Romanos 5.12) e 

Não há justo, nem um sequer, não há quem entenda, não há quem busque a Deus; todos se extraviaram, à uma se fizeram inúteis; não há quem faça o bem, não há nem um sequer. (Romanos 3.10-12)

          Quando veio a seca, e houve fome em Belém, uma família foi tentar a sorte nas terras de Moabe (Rute 1). Interessante nessa historia, o significado dos nomes. Belém (beth-lehem) significa casa de pão. Moabe significa morte. Elimeleque significa Deus Rei. Noemi significa agradável. Se atentarmos para o significado das palavras, podemos facilmente nos identificar com as personagens, e aplicar a identidade de quem somos diante de Deus ao nosso contexto.  Nos tempos dos juízes, houve fome na terra. Um homem chamado Elimeleque, natural da casa de pão, mudou-se para os campos da morte em busca de alimentos. Noemi, após a morte de seu marido e dois filhos, mudou o seu nome, para Mara, que significa Amarga. 

Porém ela lhes dizia: Não me chameis Noemi; chamai-me Mara, porque grande amargura me tem dado o Todo-Poderoso. Ditosa eu parti, porém o SENHOR me fez voltar pobre; por que, pois, me chamareis Noemi, visto que o SENHOR se manifestou contra mim e o Todo-Poderoso me tem afligido? (Rute 1.20,21)

          Mas o livro termina com Noemi segurando um bebê no colo chamado Obede, que foi o pai de Jessé, o pai de Davi, até hoje considerado o maior rei em Israel. Noemi apresentou se como amarga. Mas o povo da cidade se recusou a identificá-la como Mara, porque viram que a bênção de Deus estava sobre ela. A identidade que temos hoje, como Israel de Deus, é de benção em Cristo, filho de Davi.
          Falando de Davi, grande rei que era, cometeu adultério com Bate-Seba e mandou matar Urias, mas, apesar de todos os pecados, foi identificado por Deus como homem segundo o Seu coração. Eis o que nós falhamos e pecamos, mas Deus é capaz de ver o coração. E Deus identificou Davi como um homem que seguia o coração de Deus. A maneira que nos identificamos determina como viver e agir.   É por isso que é tão importante para nós hoje saber como o Deus nos identifica. 
          Quando pensamos de nós mesmos apenas como pecadores, não enxergamos a Deus e permanecemos no pecado.  Noemi significa agradável. Mas ela não se identificava com esse nome, identificava-se como Mara, amarga. Deus a identificava como agradável, e assim como faz conosco, fez com ela. Dirigiu a historia de sua vida no caminho da redenção de toda uma raça. Aquele que não conheceu pecado, ele o fez pecado por nós; para que, nele, fôssemos feitos justiça de Deus (2Coríntios 5.21). A Bíblia nos define como um povo santo (1Pedro 2.9), dando-nos a identidade de  raça eleita, sacerdócio real, uma nação santa, um povo de propriedade exclusiva de Deus para refletir as excelências daquele que nos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz.
          Nós somos um povo abençoado (2Pedro 1:3), conforme o seu poder divino deu-nos todas as coisas que [pertencem] a vida e piedade, através do conhecimento daquele que nos chamou para a glória e a virtude: somos os filhos de Deus (Romanos 8.14 e Gálatas 3.26), guiados pelo espírito de Deus.  Pela fé em Jesus, filhos de Deus.  
          O diabo quer nos identificar apenas como pecadores, mas somos mais. Mais ainda que pecador.  Somos salvos e redimidos pela graça.  Maravilhosa graça  que diz: "você já foi um pecador, mas agora é um Santo..." O que era injusto, mas agora é justo. O que era perdido, mas foi encontrado. Uma vez destinado ao inferno, mas agora você um cidadão do céu.  Temos de saber nossa identidade em Cristo. Nós somos os filhos e filhas de Deus.  Aos olhos de Deus, você não é conhecido pelos seus fracassos. Deus perdoou todos os pecados e nos deu um novo nome, uma nova identidade. Não seja conhecido pelo nome de Mara. Pegue o nome que Deus lhe dá. Algumas pessoas ainda andam por aí com apelidos de fracasso dizendo: “Eu sou um fracasso, porque eu não consegui salvar meu casamento, ou não sou um bom pecador porque caí em pecado, depois de aceitar Cristo” e por causa dessas identidades falsas, escondemos aquilo que Deus nos deu. Usamos estes rótulos para justificar o fracasso. Quando conhecemos a identidade em Cristo, não importa a circunstância, podemos ter certeza que de um final feliz na nossa história de vida.  O melhor está ainda por vir.
          Deus abençoa os últimos dias de trabalho mais do que os primeiros. Deus abençoou a Noemi e fez da sua amargura a semente da mais linda historia que existe, a de Jesus e de seu povo. É mais fácil suportar os tempos quando mantemos em mente que o poder de Deus e seu amor por nós. O melhor ainda está por vir. 

Então, as mulheres disseram a Noemi: Seja o SENHOR bendito, que não deixou, hoje, de te dar um neto que será teu resgatador, e seja afamado em Israel o nome deste. Ele será restaurador da tua vida e consolador da tua velhice, pois tua nora, que te ama, o deu à luz, e ela te é melhor do que sete filhos. Rute 4.14-15 

          É bom ter memória! Eu gosto de olhar para trás através de imagens na memória, mas quando nos identificamos somente no passado de culpa e amargura, escolhemos não viver. Abandonamos a casa do pão, e buscamos alimentos nos campos da morte. A palavra de Deus sempre nos leva a continuar olhando para frente, para o que está ainda por vir. Nós não podemos sequer imaginar o que Deus preparou para nós no futuro.  Mas, como está escrito: Nem olhos viram, nem ouvidos ouviram, nem jamais penetrou em coração humano o que Deus tem preparado para aqueles que o amam. (1Coríntios 2.9) 

Não que eu o tenha já recebido ou tenha já obtido a perfeição; mas prossigo para conquistar aquilo para o que também fui conquistado por Cristo Jesus. Irmãos, quanto a mim, não julgo havê-lo alcançado; mas uma coisa faço: esquecendo-me das coisas que para trás ficam e avançando para as que diante de mim estão, prossigo para o alvo, para o prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus. Todos, pois, que somos perfeitos, tenhamos este sentimento; e, se, porventura, pensais doutro modo, também isto Deus vos esclarecerá. Todavia, andemos de acordo com o que já alcançamos. Irmãos, sede imitadores meus e observai os que andam segundo o modelo que tendes em nós. (Filipenses 3.12-17)

          Atleta que só olha para trás perde a corrida. Motorista que só olha para trás bate o carro. Crente que ficar preso a como as coisas costumavam ser, paralisa no tempo e amarga a vida.  

Olhando firmemente para o Autor e Consumador da fé, Jesus, o qual, em troca da alegria que lhe estava proposta, suportou a cruz, não fazendo caso da ignomínia, e está assentado à destra do trono de Deus. Considerai, pois, atentamente, aquele que suportou tamanha oposição dos pecadores contra si mesmo, para que não vos fatigueis, desmaiando em vossa alma. Ora, na vossa luta contra o pecado, ainda não tendes resistido até ao sangue e estais esquecidos da exortação que, como a filhos, discorre convosco: Filho meu, não menosprezes a correção que vem do Senhor, nem desmaies quando por ele és reprovado; porque o Senhor corrige a quem ama e açoita a todo filho a quem recebe. É para disciplina que perseverais (Deus vos trata como filhos); pois que filho há que o pai não corrige? Hebreus 12.2-7

          Já fui chamado de muita coisa. Mamãe me chamava de Zé Pituca. Na escola fui Formiguinha Atômica, Átomo, Merendinha, Gordinho, Baixinho, Tachinha (meu sogro tentou, mas não pegou). A Marta (prima querida) me chamava de Tingão. Alemão, Careca, Tartaruga, Kojak, e outros apelidos que nem lembro ou nem sei. Já fui muitas outras coisas, mentiroso, ladrão, fofoqueiro, violento. Nada disso me identifica mais. A 6 de novembro, eu comemoro o aniversário da minha identidade de filho, de pai, de irmão, de marido e de servo. Meu nome é Daniel.

Daniel